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"Espíritas" demonstram ter preferência pelo aspecto igrejista

O "movimento espírita", há pelo menos quatro décadas, adota uma postura dúbia. Seus pregadores juram "fidelidade absoluta" e "rigoroso respeito" ao pensamento do educador Allan Kardec, mas o traem apreciando e defendendo aspectos místicos, igrejistas e moralistas que seriam prontamente reprovados pelo pedagogo francês.

E o jogo de palavras, que faz com que o malabarismo discursivo seja a única habilidade dos "espíritas", que demonstram não entender de mediunidade nem de vida espiritual, se apoia nos dois lados, na bajulação a Kardec e na exaltação do igrejismo.

É uma porção de desculpas que são feitas para permitir isso. Houve quem dissesse que é "saudável" e "natural" que os "espíritas" sejam cercados de espíritos de padres, freiras, párocos, sacerdotes, coroinhas e noviças porque os próprios membros do "movimento espírita" teriam sido assim em outra encarnação. E, o que é pior, não veem mal algum no igrejismo devido ao que entendem como "virtude comum" da "adoração ao Nosso Senhor Jesus Cristo".

Daí essa permissividade catolicizante que os "espíritas" liberam. Daí o catolicismo apaixonado de Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco. Chico Xavier era rezador de terços, adorador de imagens de santos e frequentador de missas católicas. Divaldo Franco ia às missas e fala feito um padre católico. Muito do que transmitem em seus livros são narrativas católicas, com a mesma perspectiva de fé, milagres e estereótipos de bondade e caridade dos católicos propriamente ditos.

Há um entusiasmo maior dos "espíritas" em apreciar valores católicos. Toda a prática "espírita" é uma adaptação, à sua maneira, dos ritos e simbologias católicas. O "espiritismo" se distanciou de Allan Kardec e tornou-se uma espécie de tradução informal do Catolicismo, e em certos aspectos o "espíritismo" é mais católico do que a própria Igreja Católica, quando aprecia valores do catolicismo medieval que os católicos não seguem mais.

Aliás, pior: o personagem fictício Publio Lêntulo (ou Publius Lentulus e Públio Lentulus) do livro Há Dois Mil Anos (1939), que Emmanuel teria ditado para Chico Xavier, não teve qualquer relação com os Publius Lentulus Sura que existiram na época do Império Romano, tendo sido uma invenção do século XIII de uma carta apócrifa chamada Epístola Lentuli, que nem a Igreja Católica medieval, a mesma que promovia banhos de sangue através das suas punições e da ação das Cruzadas (espécie de forças militares), aceitava como autêntica.

Se nem os católicos medievais consideram legítimo um "Públio Lêntulo" fictício, se os "espíritas" o consideram, então a coisa se agrava. Sobretudo quando, contrariando as regras das castas familiares das elites do Império Romano, um Publius Lentulus que, tendo como esposa Lívia, batizasse sua filha com o nome de Flávia, e não Livina ou Cornélia (de Cornelius, segundo nome de Publius) e usasse a forma vulgar Lentúlia, e não Lentulina ou Lentulila, como era de regra.

Nestes momentos, o "espiritismo" torna-se católico além da conta, e, ideologicamente, chega mesmo a ser mais conservador do que certas correntes católicas. Até mesmo Alceu Amoroso Lima, que havia sido conservador em seu tempo, era bem mais progressista que Chico Xavier.

Uma comparação confirma isso. No famoso programa Pinga Fogo da TV Tupi de São Paulo, em 1971, Chico Xavier reafirmava sua defesa convicta da ditadura militar, que naqueles tempos se tornava mais cruel e sanguinária (era o ano da morte de Carlos Lamarca e do sequestro e assassinato do deputado Rubens Paiva). Alceu, que escrevia sob o codinome Tristão de Athayde (ou Tristão de Ataíde, numa grafia mais atual), já havia passado para a oposição.

A preferência dos "espíritas" ao igrejismo católico é notória. A doutrina brasileira preferiu evitar o rigor científico de Allan Kardec e abraçou a deturpação de Jean-Baptiste Roustaing. Mas como o anel precioso do roustanguismo machucava os dedos do "movimento espírita", alguns roustanguistas envergonhados (Chico e Divaldo incluídos) passaram a alegar "fidelidade absoluta a Kardec".

No entanto, é só observar os textos que publicam. Em tese, eles usam a "bondade" como um "ponto de equilíbrio" de sua dupla exposição, num lado citando as ideias de Kardec, de outro expressando a deturpação da doutrina do pedagogo francês. Acham que, só por pregarem "o amor, a fraternidade e a caridade", podem transitar entre os dois terrenos com a consciência tranquila.

Mas, prestando bem atenção, o coração bate mais forte quando os textos se voltam para as formas deturpadas da doutrina de Kardec. Quando os assuntos são as crenças igrejistas, a mitologia da fé, os milagres católicos, as passagens bíblicas e todos os dogmas e totens católicos, o entusiasmo se torna bem maior. Não se trata de fazer um Ctrl+V e Ctrl+C dos trechos kardecianos.

Daí que observa-se que, se caso os "espíritas" tiverem mesmo que adotar uma escolha sincera, despindo-se de qualquer pretensiosismo da falsa fidelidade a Allan Kardec, eles teriam optado pela deturpação católica, que lhes soa muito agradável e melíflua, sem o amargo dos questionamentos científicos que deixam os místicos inseguros diante da contestação de mitos e fantasias religiosas. Se pudessem, os "espíritas" se tornariam católicos de vez, e não espíritas.

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