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Por que o "espiritismo" não enfatiza o apelo para não matar?

Estranha moral a dos "espíritas". Enquanto seus pregadores consideram o suicídio como o mais hediondo dos atos contra a vida, eles consideram o homicídio como "um mal, sim", só que "com menor gravidade".

Embora, em tese, admitam que o homicídio é "condenável" e que o homicida "pagará pelo que fez", a ênfase se torna muito menor do que a do suicídio, que os "espíritas" consideram a maior das aberrações.

Recentemente, voltaram vários textos "espíritas" contra o suicídio, vários deles desesperados, apelos um tanto neuróticos para que as pessoas não tirem suas próprias vidas. E os "espíritas" geralmente desprezam os motivos que levam pessoas ao suicídio, acham que algumas pessoas se matam porque gostam ou porque são fracas, mesmo.

Enquanto isso, os "espíritas" tentam argumentar certos casos de homicídio com um julgamento de valor moralista e um tanto hipócrita. Afinal, a doutrina brasileira não entende de Ciência Espírita, vê a vida espiritual de maneira especulativa, fantasiosa ou fingida, e se acha capaz de supor quais eram as vidas passadas de fulano e sicrano.

Assim, os "espíritas" tentam justificar os casos de homicídio atribuindo a culpa à vítima. Geralmente ela teria sido um cidadão romano, e sua morte estaria relacionada a um ato praticado contra outrem na Idade Média. 

Geralmente seu assassino foi sua vítima no passado, e este tem o atenuante de agir de acordo com o que o "espiritismo" brasileiro define como "Lei de Causa e Efeito", espécie de Pena de Talião "espírita", um "olho por olho, dente por dente" movido pelo que os "espíritas" definem como "resgates espirituais", espécie de "pegado original" que se paga não com batismo, mas com alguma vingança alheia.

Filosoficamente, não há como definir o suicídio como um ato pior do que o homicídio. Mas os "espíritas" definem o suicida como um "covarde deplorável", enquanto o homicida, em muitos casos, é creditado como um "justiceiro moral" dos "resgates espirituais" ou "reajustes morais" (ou "resgates morais" ou "reajustes espirituais", tanto faz para o moralismo "espírita").

O problema é que o suicídio, que realmente é um ato reprovável e motivado pela insegurança das pessoas, tem o atenuante de ser um ato voluntário, que não causa danos a não ser à própria pessoa, embora seus entes queridos ou parceiros de qualquer atividade possam ser de alguma forma afetados com essa tragédia.

Já o homicídio é um ato dos mais extremos de egoísmo humano. Se o suicida tira a vida por vontade própria, o homicida tira a vida de outrem, sem autorização e com total desprezo à vida alheia. Pouco importa se a vítima tem muito o que fazer, tem planos, tem a afeição feliz dos entes queridos, é uma pessoa adorada por muitos. O homicida desfaz tudo, de maneira irrecuperável, irreversível, com danos bastante severos.

Mas o próprio homicida assume riscos para isso. Mesmo quando ele é rico e diz que o ato foi cometido por alguma motivação moralista, como a "defesa da honra" e o "direito à propriedade". Além da "aventura" de tirar a vida do outro, sobretudo quando é a primeira vez, lhe afeta o organismo, abalado pela forte emoção de um ato que não deveria ser feito mas foi consumado, do qual se misturam sentimentos de ânsia, nervosismo, rancor, frieza, isso pode prejudicar a saúde a médio prazo.

O que os moralistas não percebem é que o homicida, sobretudo aquele que sabe dos riscos sociais de cometer tão aberrante ato, que causa traumas e angústias nas famílias das vítimas, tem maior incidência de sofrer infartos, câncer e, pelo nervosismo, provocar acidentes de trânsito ou reagir a um assalto. Costuma-se dizer que o homicida mata a vítima "à vista", mas ele mesmo se mata "a prazo".

Em certos casos, o homicida pode até ser vítima de outro homicídio. se algum admirador da vítima tiver essa inclinação, se ele matou tanto que passa a ser caçado pela polícia ou por grupos rivais ou se, no caso do homicida ser ligado a um grupo criminoso ou um plano de pistolagem, se tornar um informante perigoso que faça com que seus antigos líderes ou comparsas eliminarem-no por "queima de arquivo".

Isso sem falar que muitos homicidas também cometem suicídio, por não aguentar as consequências de um ato que nunca deveria acontecer. O que comprova que um homicida inevitavelmente produz a própria tragédia pessoal, é uma ilusão que a tragédia seja um atributo da vítima, o homicida sempre sente a falsa intenção de que a tragédia se encerrou com a morte da vítima.

A própria sociedade, patriarcalista e patrimonialista, está com um grande medo de ver alguns homicidas históricos, com trajetória de violações à própria saúde - como tabagismo intenso, ingestão excessiva de remédios e casos frequentes de úlceras graves - , nos obituários dos grandes jornais. 

Mesmo estando idosos, há um medo da mídia (até porque um feminicida conjugal - antes definido como "criminoso passional" - foi um homem de imprensa) e da sociedade em vê-los morrerem ou admitir que eles estejam no fim da vida, e preferem aceitar, quando muito, que eles vivam num tranquilo ostracismo.

Um portal de textos independentes definiu como "preconceituoso" um texto alertando que um outro feminicida, um ex-playboy da alta sociedade paulistana, pode estar com câncer, mesmo com um histórico comprovado de alcoolismo, tabagismo intenso e uso de cocaína. Nas mídias sociais, as pessoas reagem dizendo para "deixá-los em paz", enquanto ninguém se solidariza com as lágrimas e traumas dos familiares das vítimas, que o moralismo costuma definir como "culpadas".

É aquele preconceito social e moralista que não admite que homicidas de um certo status social também podem morrer antes dos 85 anos, ou talvez até mesmo antes de completarem 50 ou 60 anos. Esquecem os moralistas que as vítimas deles morreram com muito menos idade e com muito mais planos de vida.

Além disso, admitir a tragédia pessoal de um homicida não é sentimento de ódio ou vingança contra ele, mas a constatação realista dos efeitos diversos relacionados à vida do homicida, seus descuidos e imprudências. Se um homicida fumava muito e ainda consumia cocaína no passado, ele simplesmente sofrerá as doenças graves próprias desses males. Seria absurdo dizer que ele "se curou" acabando com a vida de outrem e, como que numa antropofagia, somar para si os anos perdidos da vítima.

Imagine então um homem rico de 42 anos que, na juventude, matou a namorada e que fugiu de seu lugar de origem para viver bem longe de seus conhecidos. Aí ele está no exterior, e, vendo a ex-cunhada (portanto, irmã da vítima) viajando na cidade, ele sofre um infarto e morre. Isso se dá porque ele acaba sendo abalado pelas armadilhas da ansiedade e do imprevisto, aliados às suas condições orgânicas. Não é sendo feminicida que ele estará livre disso.

Não há uma ênfase dos "espíritas" para impedir que pessoas matem outras. Não há uma campanha neste sentido. Neste caso, a religião judaica, da parte de Moisés, deu um pequeno passo à frente com a inclusão do apelo "Não Matar" como o quinto dos Dez Mandamentos. Isso num contexto de muitos genocídios que até hoje ocorrem no Oriente Médio.

Fala-se que os suicidas serão desgraçados, que tirar a própria vida é uma covardia severa, um ato abominável e deplorável. Mas os "espíritas", não bastasse não atentarem para os motivos que levam uma pessoa a se suicidar - eles se preocupam mais com as consequências, e não com as causas -  , também não alertam para os danos irreparáveis que os homicidas trarão em sua vida.

Tirar a vida de outrem acaba sendo um suicídio lento. Como é o mais extremo ato de egoísmo existente na humanidade, ele inevitavelmente causa danos a seu autor. Ele "morre aos poucos", porque atrai ódios pessoais, provoca traumas alheios, causa prejuízos dos mais graves à sociedade. 

Prevenir o homicídio, analisando as neuroses pessoais e as raivas individuais, e identificando as perturbações mentais do indivíduo, ajudaria muito a poupar tantas vidas ceifadas sem necessidade. É ver se o indivíduo está estressado, quer mais do que precisa ou tem menos que o necessário, contendo-o em seus surtos de fúria e irritação, seria uma forma de impedir que pessoas tirem a vida de outrem, já que boa parte dos homicídios é por motivos fúteis e brigas à toa.

Ver as raízes que levam as pessoas a se matarem ou matarem outrem, vendo com isenção as perturbações mentais e identificarem as tensões que potencialmente os empurrariam para tais atos, é bem mais caridoso do que atribuir danos futuros aos suicidas ou justificar certos homicídios pelas alegações moralistas "do além" ("resgates morais") ou "do lado de cá" ("defesa da honra e da propriedade"). A ideia é as pessoas, sobretudo os "espíritas", se despirem de neuroses moralistas.

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